Um segundo Big Bang teria dado origem à matéria escura – misteriosa substância que forma a maior parte do Universo. É o que diz uma pesquisa publicada na revista Physical Review D.
De acordo com a teoria mais conhecida, tudo no Universo (matéria, energia, planetas e estrelas) surgiu de uma grande explosão cósmica: o Big Bang. Mas agora, cientistas propõem que outro evento parecido pode ter acontecido logo depois, gerando exclusivamente a chamada matéria escura.
Em poucas palavras:
- Cientistas propõem que um segundo Big Bang pode ter originado a misteriosa matéria escura do Universo;
- Esse evento teria ocorrido um pouco depois do Big Bang original, de forma separada;
- A explosão teria criado um Setor Escuro, com partículas diferentes das da matéria comum;
- A matéria escura não interage com luz, mas afeta o espaço com sua gravidade;
- Ondas gravitacionais podem ser a chave para detectar sinais desse possível Big Bang Escuro.
A ideia de um “Dark Big Bang” – ou Big Bang Escuro – surgiu em 2023, proposta por Katherine Freese, diretora do Centro de Cosmologia e Física de Astropartículas do Texas, e Martin Winkler, pesquisador da Universidade do Texas. Eles sugeriram que essa explosão paralela poderia explicar a origem de algo que intriga os cientistas há décadas: uma forma invisível de matéria que domina o Universo, mas que ninguém consegue ver.
Agora, dois pesquisadores da Universidade Colgate, em Hamilton, EUA, ampliaram essa teoria. Cosmin Ilie e Richard Casey exploraram como e quando esse segundo Big Bang poderia ter acontecido. Eles criaram cenários possíveis em que ele teria ocorrido até um ano após o Big Bang original.
A pesquisa da dupla também sugere onde procurar sinais do Big Bang Escuro. Segundo Ilie, o novo modelo mostra que esse fenômeno pode ser ainda mais provável do que se pensava antes.
Matéria escura compõe 85% do Universo
Mas o que é a matéria escura? É um tipo de matéria que não emite luz, não reflete, nem interage com radiação – por isso, não pode ser vista diretamente. Ainda assim, sabemos que ela existe por causa dos efeitos gravitacionais que provoca em estrelas e galáxias.
Hoje, os cientistas estimam que 85% da matéria do Universo seja escura. A matéria comum, que forma pessoas, planetas e tudo o que vemos, representa só 15%. Isso significa que a maior parte do Universo é feita de algo que não conseguimos detectar com os olhos ou instrumentos comuns.
A teoria mais simples diz que matéria comum e matéria escura nasceram ao mesmo tempo, no mesmo Big Bang. Essa ideia segue o chamado princípio da Navalha de Occam: a explicação mais simples costuma ser a correta. Mas isso não quer dizer que o Universo funcione assim.

“A natureza não precisa obedecer à nossa preferência por explicações simples”, afirmou Ilie em entrevista ao site Space.com. Ou seja, é possível que a matéria escura tenha surgido separadamente, por meio de um evento exclusivo – o tal Big Bang Escuro.
Como essa matéria não interage com a luz, suas partículas devem ser diferentes de elétrons, prótons ou nêutrons, que são os blocos básicos dos átomos. Ela provavelmente não pertence ao que chamamos de “matéria bariônica”, que é a matéria comum do Universo.
A única forma de detectar a presença da matéria escura é observando como ela afeta a gravidade ao seu redor. Segundo Ilie, isso se encaixa perfeitamente na ideia do Big Bang Escuro: partículas que não interagem com a matéria comum, mas ainda assim afetam o espaço ao seu redor com sua massa.
Leia mais:
- Anomalias da Via Láctea podem ser provocadas pela matéria escura
- Lente gravitacional revela “ponte” de matéria escura entre galáxias
- Nova hipótese sobre a matéria escura muda tudo o que se sabe sobre o Universo
Ondas gravitacionais podem confirmar teoria do Big Bang Escuro
Essa teoria também ajudaria a explicar por que todos os testes feitos até hoje para detectar diretamente a matéria escura fracassaram. Como ela não interage com luz ou partículas comuns, só pode ser “sentida” pela gravidade.
Ilie explica que o Big Bang original foi um momento de expansão superacelerada que terminou com o “reaquecimento”, quando a energia do Universo virou partículas. Nesse momento, teria surgido a matéria comum. Mas no cenário com dois Big Bangs, a matéria escura surgiria depois.
Ela poderia ser criada pelo decaimento de outro tipo de campo de energia, que só interage com o que os cientistas chamam de “Setor Escuro”. Esse setor seria composto por partículas que ainda não conhecemos, todas diferentes das que compõem o mundo visível.
Richard Casey, coautor do estudo, afirma que é possível que esse Setor Escuro tenha suas próprias leis, forças e partículas, assim como o mundo visível tem elétrons, quarks e fótons. Em outras palavras, poderia existir um Universo oculto com funcionamento próprio.

O trabalho dos pesquisadores foi definir as regras matemáticas possíveis para que o Big Bang Escuro se encaixe na história do cosmos. Eles abriram um novo caminho de possibilidades que ainda não tinham sido exploradas pela ciência.
Além disso, apontaram onde procurar provas da existência desse evento: em ondas gravitacionais. Essas ondulações no espaço-tempo foram previstas por Albert Einstein em 1915 e detectadas pela primeira vez em 2015. Elas podem ser geradas por eventos violentos, como o Big Bang Escuro.
Segundo Ilie, as ondas geradas por esse segundo Big Bang poderiam ser registradas por instrumentos como o Square Kilometer Array (SKA) ou o International Pulsar Timing Array (IPTA), que monitoram sinais de rádio e alterações precisas em pulsares.
Com dados mais precisos, será possível restringir os cenários possíveis do Big Bang Escuro ou até mesmo confirmar sua existência. Isso abriria caminho para entender a verdadeira origem da matéria escura – e talvez, reescrever a história do Universo.
Por fim, os cientistas lembram que ainda é preciso considerar como o Setor Escuro e o mundo visível poderiam interagir. Caso essa ponte exista, seria possível estudar essa interação com aceleradores de partículas e ondas gravitacionais, buscando pistas de um segundo começo para o Universo.
O post Matéria escura teria surgido de um segundo Big Bang apareceu primeiro em Olhar Digital.